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A participação da agricultura familiar na alimentação escolar em Pelotas

 A participação da agricultura familiar na alimentação escolar em Pelotas

Caroline Velloso, Robson Loeck, Anderson Rotuno e Francisco de Arruda (*)

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é uma importante política pública a zelar pela segurança e pela soberania alimentar no país. A Lei 11.947/2009 define que no mínimo 30% dos alimentos ofertados nas escolas municipais e estaduais devem ser produzidos por famílias de agricultores familiares, e a compra realizada com dispensa de processo licitatório, via Chamada Pública.

Por trás dessa obrigatoriedade está a intenção de incentivar a agricultura familiar e a produção de alimentos, minimizando assim o êxodo rural, e a preocupação com a saúde dos escolares, visto os altos índices de sal, açúcar e gorduras presentes nos alimentos industrializados.

Por ser de responsabilidade governamental e se valer de recursos públicos, o PNAE é caracterizado como um “mercado institucional”, que a partir de 2009 permite ir além das compras geralmente realizadas em grandes redes atacadistas. O Programa passa, então, a se preocupar com o desenvolvimento rural local, o valor nutricional dos produtos e a incentivar a cadeia curta de distribuição. A lógica somente monetária dos “pregões” cede espaço à possibilidade de inclusão de pessoas da agricultura familiar e desafiou a extensão rural a “levar a novidade” tanto para os agricultores quanto para os gestores municipais.

Para se ter uma ideia, em 2012, o PNAE Municipal realizado em Pelotas tinha adquirido somente 1% de produtos advindos da agricultura familiar, fato esse que acabou por gerar discussões no Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de Pelotas (COMDER). A “pressão” dos agricultores familiares para participar dessa política pública e a preocupação do poder público municipal e dos órgãos de controle social, no caso, o Conselho de Alimentação Escolar (CAE) e o COMDER, fez surgir, em fevereiro de 2013, um Grupo de Trabalho intitulado de GT PNAE de Pelotas. Grupo esse formado por vários atores sociais envolvidos com a alimentação escolar municipal: cooperativas de agricultores familiares, Emater/RS-Ascar (Extensão Rural Oficial do RS), CAE, COMDER e poder público municipal, em especial, com a participação das Secretarias de Educação e Desporto, de Desenvolvimento Rural e de Finanças.

A primeira reunião do GT ocorreu em abril de 2013. No desenrolar das demais reuniões mensais, que aconteceram de forma permanente e ininterrupta até o ano de 2019, o grupo de trabalho demonstrou ser um espaço de efetiva participação e que propiciou o diálogo e a aproximação dos agricultores familiares com a gestão pública municipal.

A interação e a construção coletiva de processos de trabalho resultaram na evolução do PNAE Municipal. A aquisição de produtos da agricultura familiar, conforme informado pela gestão municipal nas reuniões do GT, passou de 1% para 25,2% em 2013. Nos anos de 2014, 2015 e 2016 atingiu, respectivamente, 43%, 48% e 38%. E, para além do aumento dos percentuais de compra, podem ser elencadas outras “conquistas”: a) o próprio GT passou a ser uma instância de controle social; b) a realização de capacitações ofertadas pelo Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição do Escolar da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – CECANE/UFRGS para a formação dos recursos humanos envolvidos com a execução do PNAE; c) a elaboração de um calendário sobre a sazonalidade dos alimentos produzidos no município; d) a criação de um checklist para o acompanhamento dos trâmites e prazos referentes ao processo “burocrático” para a aquisição de alimentos; e) a realização de um estudo sobre as bases legais para a intercooperação entre cooperativas.

Com a expertise adquirida, o GT do PNAE acabou também por contribuir com outro Programa do governo federal que viria a ser implementado em Pelotas anos mais tarde pela Secretaria Municipal de Assistência Social, qual seja, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que fora substituído recentemente pelo Programa Alimenta Brasil (PAB). Outra importante contribuição sua foi a discussão e a elaboração de texto que veio a se tornar a Lei Municipal 6.388/2016, que “dispõe sobre as compras públicas para aquisição de gêneros alimentícios pelo Poder Executivo e pelas repartições municipais de Pelotas, que deverá ser no percentual de no mínimo 30% do total adquirido da agricultura familiar”.

É evidente que ainda há muito a se avançar em relação ao PNAE em Pelotas, mas pelo apresentado fica claro a contribuição do GT para a sua implementação. A participação da Emater/RS-Ascar no grupo de trabalho permitiu a ela fazer o recomendado pelo Programa, ou seja, “cumprir com o seu papel” de realizar o assessoramento aos agricultores e ao poder público para o bom desenrolar dessa política pública, que promove a inclusão social, incentiva a comercialização de alimentos dentro do próprio município, gera renda e incentiva a permanência das famílias de agricultores no campo. Ainda, e não menos importante, é preciso ressaltar a sua contribuição para que os escolares tenham acesso a alimentos de qualidade nutricional diferenciada e que respeitam a cultura alimentar dos pelotenses.

Vida longa ao PNAE e que se realize com cada vez mais produtos da agricultura familiar! 

(*) Caroline Velloso (Farmacêutica), Robson Loeck (Sociólogo), Anderson Rotuno e Francisco de Arruda (Engenheiros Agrônomos) são Extensionistas Rurais na Emater/RS-Ascar.