Por que Repensar? II

 Por que Repensar? II

Por Lauro E. Bernardi*

“A ausência de expertises e de capacidade operacional em significativas áreas estratégicas da Instituição explicita ausência de processos internos e externos que (re)estruturem o Quadro de Lotação em face a atual realidade e demandas que se colocam a este serviço público” (Pesquisa ATERS – visão de presente e futuro).

Ao longo de 2021, tive oportunidade de participar do grupo de trabalho que encaminhou o processo de escuta externa que, somada à pesquisa interna, culminaria com os Seminários Repensar. Foram muitas reuniões virtuais noturnas com universidades, representações sindicais da agricultura família e camponesa, públicos tradicionais (indígenas, pescadores artesanais e quilombolas), rede cooperativa, pesquisa, instituição coirmã de Aters, entre outras.

Ouvir não é fácil, mas este foi o propósito. E, as críticas necessárias surgiram. Mas todas estas parcerias que dialogaram com a representação dos trabalhadores e trabalhadoras da Emater/RS registraram pontos comuns. O primeiro foi a satisfação de estarem debatendo a assistência técnica, social e a extensão rural que necessitam. Serem ouvidos! A segunda questão foi a afirmação de que “necessitamos deste serviço público qualificado e forte!”.

A leitura da imagem abaixo, que representa o tripé da sustentabilidade da Aters, traduz um pouco estas auscultas. Rumo adequado (com mais foco ou abrangência) e capacidade operacional significa gente em quantidade e qualidade para dar materialidade a esse rumo. E, credibilidade que expressa o reconhecimento por essa capacidade qualitativa e operacional que impacta a vidas das famílias assistidas.

No campo interno (visceral) a pesquisa apresentou-nos para reflexão, questões positivas expressas nas fortalezas institucionais e as fragilidades percebidas pelos trabalhadores da Emater/RS. Questões que foram muito similares e que indicam fortemente a necessidade de diálogo construtivo e de enfrentamento para além da mera constatação ou lamúrias de corredores. E esse é o desafio de quem faz extensão cidadã, que é governado, mas que também quer governar, contribuir com sua Instituição.

Neste contexto, um dos temas que foi renitente e, consta na chamada desta síntese, diz respeito à sobrecarga e ao apequenamento da capacidade operacional que se mostra incompatível com o tipo de demanda que a agricultura familiar apresenta cotidianamente às bases desta instituição, ou seja, às equipes municipais (exatamente aquelas que querem ser ouvidas).

Engana-se quem acredita que é possível fazer sempre mais com menos. De que não necessitamos de expertises na Instituição. Ouvimos sistematicamente que, hoje, o conhecimento está na palma da mão. Errado! O que está na palma da mão é a informação, via de regra de produtos e não de processos. O quadro abaixo, cunhado pelo ex-extensionista e atual pesquisador da área de fomento da Embrapa, José Eloir Denardin, colabora com a presente reflexão. A aplicação do protocolo, que é mera informação técnica ou social, se dá através do manejo. Sua aplicação, necessita da experiência e da mediação humana, exatamente nosso ressignificado espaço de trabalho junto às famílias rurais, particularmente àquelas que mais precisam.

Com a saída de muitos colegas competentes, vem ocorrendo uma crescente erosão qualitativa da capacidade operacional da Instituição em todas as frentes. A pesquisa interna explicitou esta realidade através de vários ângulos, por ser visível, de saltar olhos minimamente atentos, quer seja no suporte, nas ausências de processos de capacitações continuadas, nos fluxos de orientação, que antes sempre chegavam ‘redondos’, na incapacidade de acolher com a qualidade esperada múltiplas demandas quando se tem uma “euquipe”.

Um exemplo simplório que empresta materialidade a essas ausências de expertises pode ser observado na produção de materiais didáticos institucionais. Vai da atualização do elementar folder à absoluta ausência de alguma publicação expressiva institucional como boletim, revista, ou mesmo conteúdos para suporte à demanda crescente da Aters digital (este tema das novas TICs requer outra síntese para debate dado sua atualidade e relevância). A razão: falta gente. Gente com perfil, com “penso”, que mediante processos transparentes, normatizados e de valorização, ocupem tais espaços de suporte, articulação, pensamento estratégico e produção replicável.

Essa forma de valorização dos trabalhadores e trabalhadoras da Aters, que ascendiam de forma transparente para as novas funções e com eco das demandas de seus colegas, foi rompida. Há que se ter espaço para o diálogo sobre o processo em curso. Modernizar a forma é sempre necessário, contudo, acreditar que conhecimento tem geração espontânea e sem gestores, sem robustos processos de capacitação continuada, não nos permitirá responder aos complexos desafios de sustentabilidade que os atores sociais esperam da Aters pública.

Fazer tudo ou priorizar focos de forma dialógica? Quanto bom debate a fazer! Entretanto, é preciso fazê-lo com a legitimidade de quem é parte fundante desta senhora instituição e possui as condições de repensar ações do presente, contribuindo assim com os gestores.

* Lauro E. Bernardi, Engenheiro Agrônomo da Emater/RS-Ascar.

ASAE

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