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Não se pode normalizar este caminhar errante da ATERS

 Não se pode normalizar este caminhar errante da ATERS

Por Lauro Edilso Bernardi (*)

Logo teremos possibilidade de participar e contribuir com algo parecido com o que foi o referencial repensar da extensão rural. Momento importante para olharmos pelo retrovisor e coletivamente apontarmos caminhos para um futuro que recupere significado e espaços deste serviço público. Idealmente que se possa fazer esse debate junto com a Direção da Emater-RS.

Parafraseando um colega atento ao contexto de que aquilo que passou a nos sustentar (a política) é o que nos conduzirá ao fim, é que inicio esta reflexão. Parto de alguns pontos que considero fundantes na perspectiva da superação deste envelhecimento da forma de gestão e propósitos Institucional.  

Uma Instituição que não atualiza seu ‘software operacional’ pela negação do debate franco e pela ausência de efetivo espaço de controle social, vai sendo conduzida a caminhos errantes. Inverte a lógica. Distancia-se daquele balizamento atualizado sobre método e propósito e avança no rumo do seu próprio fim. Extensionistas sobrecarregados (poucos, muito poucos), cobrados, liderados por esta negação da reflexão, que teria a potência de atualizar rumos e de promover sintonias com aquela cumplicidade necessária entre gestores e executores.

Mas há espaço para reverter este descaminho? Para substituir assessores improdutivos por profissionais que de fato produzam resultados e aquilo que a sociedade necessita? Há espaço para atualizar esta estrutura de gestão arraigada na década de 70? Há espaço de fato para gestores que tenham autonomia para fazer do discurso sua prática? 

Entre o pessimista catastrófico e o otimista ingênuo, há espaço para a figura com a qual me identifico: a do otimista realista, que percebe o discurso e a prática da dita eficiência, efetividade, entrega, muito além da palavra fácil. Mas a resposta às questões acima é afirmativa: a ATERS ainda tem fortalezas e razões de existir, muito pela demanda de quem a busca e muito pelo comprometimento de quem, cotidianamente, a executa em distintos espaços. 

A pesquisa realizada pela ASAE já transcorreu mais de um ano e, surpreendentemente, quase todas aquelas questões e ausências apontadas pelo corpo funcional foram agravadas (ressalvo que a democracia voltou). Isso é um indicativo importante a ser percebido, dado a incapacidade de superar-se este estado de letargia. O pó levantado pela dinamização do processo eleitoral da diretoria técnica e a indicação positiva e muito bem vinda de uma colega de carreira para a presidência, vai esmorecendo sem percebermos mudança, ficando como diz a expressão de Orlando Neves “tudo como dantes, quartel-general em Abrantes”. Parece que o enredamento à visão do Estado mínimo delimita as possibilidades. Há também o limite dado pelo enrosco aprofundado da partidarização das bancas na gestão. Tem aquele gestor ruim que cai de paraquedas sem nem saber minimamente o que é extensão rural e aquele que permanece ‘n’ anos no carreto da continuidade, porque é banca de A ou B. Tais atores conduzem enquanto correias de transmissão a que a ATERS seja cada vez menos um serviço de Estado. E aqui não reside nenhum resquício de ingenuidade pois distintos governos sempre orientaram com a legitimidade do voto o rumo das políticas públicas a executar, fazendo indicação de simpatizantes ao seu projeto. Que assim seja, mas que tenham compreensão e competência para a liturgia do cargo. 

Os pilares daquele tripé da sustentabilidade da extensão rural que vai do rumo (falta diálogo competente com pensadores, agentes executores e beneficiários para redefini-lo), capacidade operacional (cada vez mais trabalho e cada vez menos gente e estrutura que se associa  a ausência de pensamento estratégico inovador de médio e longo prazo) e credibilidade (que é a ‘moeda do reconhecimento social’ por de fato se estar fazendo aquilo que se deveria fazer), encontram-se fragilizados.  Já ouvimos na busca de apoio político parlamentar à disputa orçamentária “que a Emater-RS não tem mais aquele reconhecimento de outrora, que já não há mais um consenso sobre sua capacidade e necessidade”. 

Bueno, um evento interno que busque repensar os serviços de ATERS a partir desta realidade, não pode ficar apenas nas chorumelas. Este olhar pelo retrovisor deve estar presente sim, mas apenas como ponto partida para a elaboração de propostas que tenham como propósito a busca da superação  daquilo que se faz de conta não estar acontecendo. Não se pode naturalizar e considerar normal este estado de esboroamento institucional! 

Alguns pontos para os quais considero importante construirmos conteúdos para intervenção:

– O debate interno (não corporativo-pegajoso), deve apontar para um desenho que incorpore como instância de gestão e controle social de fato, mecanismo que permita que usuários, gestores e representação dos executores (trabalhadores da ATERS), dialoguem em ambiente transparente, guiando rumos pactuados e avaliados. Há que se superar a forma de planejamento que secundariza a demanda dos usuários. A pluralidade deste serviço público deve trabalhar sim pautas e políticas públicas de responsabilidade de Estado. Entretanto, metas verticais estruturadas sem adequada compreensão e conexão com a capacidade operacional e os princípios da Política Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Rio Grande do Sul – PEATERS, não são satisfatórias. Neste sentido, a Lei 14.245 de 2013 que hoje dá legalidade aos contratos, foi muito bem desenhada, instituindo no âmbito da SDR, o Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural ‘composto majoritariamente por representantes das entidades do segmento rural’. O CTA deve e pode igualmente ser espaço de grandes concertações sobre este tema.

– A estrutura hierárquica operacional e técnica (apesar do esforço de muitos em dar conta das múltiplas atribuições), está desatualizada, defasada e superada para dar conta dos desafios atuais. Há que se redesenhar e hiper profissionalizar esta estrutura. Compor elos de articulação com ensino, pesquisa, tratar da formação continuada, produzir expertises Institucionais de referência, publicações, entre outros. O que vamos propor? 

– Não se faz desenvolvimento sem gente qualificada permanentemente. Dado essa premissa, temos que apontar para escopo de equipes modulares básicas adequada a cada realidade e orçamento (há um trabalho desenvolvido pela  UFRGS e um GT institucional que arquitetou mecanismos de dimensionamento arejado do tamanho das equipes, definindo o Quadro de Lotação). Este mecanismo necessita ser atualizado à realidade e evolução dos meios atuais disponíveis. Pode ser menor, ou outros desenhos criativos, mas há que se ter um mínimo de decência na definição das equipes básicas x demandas e novos compromissos. Caso a definição atual se mantenha na lógica do fazer mais (sem qualidade) com menos, há que se avançar para linhas prioritárias de intervenção e limitar  abrangência. Aqui vale refletir sobre o alcance de nossos números que, com mil trabalhadores a menos, alcançam praticamente o mesmo patamar. Como? Quais consequências?

– Há que se propor um radical investimento em duas áreas estratégicas. No setor de informática, o que necessitamos? Lembrando que o limite hoje é falta de gente, dado que a remuneração do PCS é baixa para esta área dinâmica ‘não segurando profissionais” (temos que mudar isso).  A segunda carência ocorre na área de produção de conteúdo complementar de suporte para a área fim (ATERS digital). Há que se estruturar um núcleo mínimo de três pessoas para avançarmos neste campo da conectividade em estreita sintonia com a estrutura de suporte técnico e social.

Esta é uma primeira provocação rápida e simplória que decorre da leitura que faço da pesquisa da ASAE e da escuta aos movimentos, academias e entidades parceiras realizadas há mais de um ano pelo GT de extensão rural. Muitas das questões pontuais que nos afligem, poderão ter encaminhamento se garantirmos avanços nestes pontos.

Espero que possamos gerar e acumular argumentos para intervenções maduras que decorrem destes olhares distintos que devemos explicitar e debater, pois teremos uma oportunidade ímpar para contribuir com este processo que acontecerá em todas regiões. Espero que tais vozes possam ecoar e serem acolhidas pela Instituição.  Finalizo destacando aqui a importância do(a)s jovens extensionistas disputarem espaços  enquanto delegados regionais ao evento final estadual, não deixando espaço para gente sem compromisso, de discurso enviesado, vazio, saudosista e velho.                                                                                                      

(*) Lauro Edilso Bernardi é engenheiro agrônomo e membro do GT Extensão Rural da Asae.